Jerónimo de Sousa critica dois pesos
e duas medidas do Governo

O escandaloso perdão<br>ao Novo Banco

Jerónimo de Sousa acusou o primeiro-ministro de fazer um discurso de «apagão da realidade social», revelador não de «insensibilidade ou ignorância» mas de uma «opção política virada para o aumento da exploração».

O Governo aumentou exponencialmente a pobreza e tornou-se numa fábrica de pobres

LUSA

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«Falar como falou deste Governo que foi uma autêntica fábrica de pobres, que aumentou exponencialmente a pobreza, só pode traduzir a concepção de que estes dramas são apenas danos colaterais», acusou o Secretário-geral do PCP, pondo em evidência as duas faces desta política que ao mesmo tempo que «esmaga os trabalhadores com impostos» concede um perdão fiscal de muitos milhões ao Novo Banco.

Ao tema do perdão fiscal a esta instituição bancária regressou o líder comunista no último debate quinzenal (dia 20), recordando que há duas semanas, quando questionado por si, Passos Coelho garantira não ter havido nenhum regime de excepção para aquela instituição bancária e que tudo está feito de acordo com o regime existente no Estatuto dos Benefícios Fiscais.

Ora no dia a seguir, observou, os deputados do PSD e do CDS apresentaram uma proposta para «legalizar retroactivamente o perdão fiscal ao Novo Banco, ainda por cima tentando fazer isso à socapa numa lei sobre comissões bancárias».

«O Governo atribuiu ao Novo Banco um perdão fiscal que não podia atribuir, tentou depois aprovar uma lei para o legalizar e como essa lei já não foi publicada a tempo está agora a tentar legalizar o perdão fiscal retroactivamente», resumiu Jerónimo de Sousa, para quem este perdão fiscal constitui um «verdadeiro escândalo».

Em causa, com efeito, está um valor de pelo menos 85 milhões de euros em emolumentos de registos, sendo que em Imposto de Selo e IMT o montante do perdão pode ascender a mais umas centenas de milhões de euros.

«Considerando o volume total dos créditos transferidos para o Novo Banco e numa estimativa feita por baixo poderá estar em causa um perdão fiscal num total de 445 milhões de euros, isto sem contar com a transferência de créditos fiscais que pode atingir mais 240 milhões de euros para o Novo Banco, à boleia das mesmas leis feitas à medida», alertou o líder do PCP, que contrapôs este autêntico maná a um banco com a forma implacável como o Governo trata os trabalhadores e os pequenos empresários, «não perdoando um cêntimo a quem se atrasa a pagar impostos, penhorando casas de habitação por dívidas de 1800 euros».

Sem cobertura legal

Passos Coelho, na resposta, depois de recusar que haja da sua parte qualquer tentativa de «apagão da realidade» e de achar a abordagem do PCP ao perdão fiscal imbuída de «preconceito», alegou que nessa mesma manhã a ministra das Finanças já respondera em comissão de Orçamento e Finanças a esta matéria, quando na verdade esta se furtara por completo a responder às perguntas do deputado comunista Paulo Sá (ver caixa).

Discordou que «possa haver dúvidas» sobre esta matéria, ou que a maioria tenha «tentado à socapa legalizar esse benefício fiscal que a AT entendeu conceder», defendendo que «foi tudo às claras», e que «para o Governo e para a maioria o espírito do legislador nesta matéria do código dos benefícios fiscais é muito claro quando trata de reestruturações de empresas».

Tão claro ou tão pouco – e aqui é que o rabo do gato ficou de fora – que logo a seguir admite que o «código de benefícios fiscais não contemplava expressamente as possibilidades de resolução» (a resolução do BES por ordem do Banco de Portugal e do Governo), embora ressalvando que «quando uma lei expressamente o não prevê, ela pode ser interpretada e foi isso que a Autoridade Tributária fez».

«Não é preciso legalizar nada, porque a interpretação da AT é legal», afirmou, acrescentando, contudo, com vista a «impedir qualquer dúvida que venha a colocar-se no futuro para outras operações» que se «fez esta clarificação».

«É tão simples quanto isso. Não há mais nada a responder», disse, secamente, dando por concluída a explicação.

«Já houve aqui um avanço», replicou Jerónimo de Sousa, interpretando as palavras de Passos Coelho como um sinal de que a atribuição desses benefícios fiscais não tinham cobertura legal. «E para dar a cara com a careta foi preciso que a maioria fizesse uma alteração à lei, de calçadeira, a fim de legalizar aquilo que não era legal, ou seja a atribuição desses benefícios», constatou o líder do PCP, convicto de que este é mais um exemplo da política de dois pesos e duas medidas.


Dramas sociais

Para as consequências desta política no plano social chamou muito particularmente a atenção Jerónimo de Sousa, trazendo à colação a situação dos 175 novos casos por dia de portugueses, empresas, famílias que «não têm nem salário nem património para pagar as suas dívidas».

«Para estes, o Governo é implacável e ordena: paguem! Para a Banca, perdoe-se! Esta é a grande conclusão que se pode tirar de uma política de dois pesos e duas medidas», constatou o líder do PCP.

Por si lembrados foram ainda os dramas sociais que têm expressão, por exemplo, na questão das creches, antes de se questionar se acaso o chefe do Governo sabe da existência de milhares de famílias jovens que estão na fila de espera para encontrar uma creche para os seus filhos.

«Tão preocupados com a natalidade, mas tudo soa a falso, pois o Governo não lhes dá resposta», sublinhou, encontrando aqui mais um exemplo da política dúplice de PSD e CDS-PP.

E a este propósito, concluiu a sua intervenção dando a conhecer o pensamento que lhe ocorrera ao ouvir um recente discurso do chefe do Governo em Guimarães: «o senhor primeiro-ministro canta bem, mas não me alegra, nem aos milhões de portugueses desempregados ou na pobreza».

E revelou ter dito para os seus botões: «sinto-me profundamente confiante numa coisa: com certeza que um dia o povo português o vai mandar cantar para outra rua».


Fugir ao essencial

O primeiro-ministro, seguindo as pisadas de Maria Luís Albuquerque na comissão de Orçamento e Finanças, onde esteve nessa manhã do debate quinzenal, deixou sem resposta as questões muito concretas colocadas pelo Secretário-geral do PCP.

«O perdão fiscal que foi concedido ao Novo Banco abrange ou não também o Imposto de Selo e o IMT? O perdão desses impostos já foi concedido ou estão ainda a prepará-lo? Quais são exactamente os montantes totais do perdão fiscal ao Novo Banco? Desmente que o perdão fiscal em emolumentos concedido ao Novo Banco é anterior à Lei 23-A/2015? Como é que justifica esta política de perdão fiscal aos bancos ao mesmo tempo que esmaga os portugueses com impostos?», indagara o dirigente do PCP, interpelando directamente o chefe do Governo.

Esgueirando-se às perguntas, Passos Coelho repetiu que «não há nenhum regime excepcional» e que o «Governo, sob proposta da Autoridade Tributária viabilizou, ao abrigo do estatuto de benefícios fiscais, um conjunto de operações do Novo Banco que estão de acordo com as regras do código, apropriadas para poder ser concedidas». 

 



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